O JUDICIÁRIO BARRA A RETOMADA DOS IMÓVEIS PELOS BANCOS

Supremo Tribunal Federal entende que mesmo devendo para o banco o consumidor pode ter direito à posse do imóvel

PAULO EDUARDO DUARTE DE OLIVEIRA

Há quase uma década o mundo viveu uma grande crise econômica.

No Brasil, contudo, as coisas iam na direção contrária. A população das classes mais baixas usufruíam dos estímulos do Governo na economia e passaram a adquirir bens de consumo de valores mais elevados.

A partir deste período o crédito imobiliário cresceu e a população passou a viver o sonho do financiamento da casa própria.

Contudo, o cenário econômico no País mudou e, hoje, muitos daqueles brasileiros viram o sonho se tornar pesadelo e, sem poder pagar as dívidas, são obrigados a se desfazerem dos seus imóveis, que muitas vezes são retomados pelos bancos e leiloados. Mas, como se verá a seguir, em muitos casos há solução, e com informação e assessoria esta perda pode ser evitada.

Nos últimos anos o Brasil vem atravessando uma grande crise política e econômica. Por isso, o crédito e o poder de compra do povo diminuíram.

Assim, sem dinheiro para honrar os compromissos básicos, uma parcela da população se viu imersa em dívidas. Por esta razão, muitos contratos de financiamento imobiliário deixaram de serem pagos em dia.

Os bancos, a fim de evitarem prejuízos maiores, intensificaram a cobrança dos débitos atrasados. Também, por isso, as instituições financeiras intensificaram as ações para a retomada dos imóveis dos devedores, para leiloá-los e, assim, recuperar o prejuízo advindo da inadimplência.

Ocorre que muitas vezes o imóvel financiado é o primeiro e o único imóvel da família e justamente por esta razão é que inúmeros devedores têm se socorrido de advogados para assegurar o seu direito à moradia judicialmente.

Isso porque a existência de  cláusulas abusivas pode evitar a perda do bem.

Neste sentido há inúmeras  decisões dos Tribunais Superiores que dão amparo ao consumidor inadimplente. No Superior Tribunal de Justiça já há decisões no sentido de proibir a retomada do imóvel e a inclusão do nome do  consumidor em órgãos de proteção de crédito (SPC/SERASA), mesmo quando ele estiver inadimplente. (RECURSO ESPECIAL Nº 1.067.237- SP).

E este não é um entendimento isolado, uma vez que inúmeros são os casos em que se discute a constitucionalidade da retomada dos imóveis de devedores de contratos de financiamento bancário. No Supremo Tribunal Federal este tema já foi pautado no julgamento de dois Recursos Extraordinários (RE. 556520 e RE. 627106).

De acordo com o Ministro Marco Aurélio, em notícia veiculada no site do STF “o princípio da razoabilidade é conducente a concluir-se que ninguém deixa de pagar prestação do próprio teto e da respectiva família sem uma causa ponderável”.

O magistrado avaliou que a perda de bens sem um devido processo legal é incompatível com a Constituição e, portanto, “contrária a um verdadeiro Estado Democrático de Direito”.

Segundo a legislação vigente, quando o devedor do financiamento não paga o seu débito em dia, o banco fica autorizado a publicar editais e a efetuar o leilão do imóvel hipotecado. Entretanto o Poder Judiciário tem afastado a aplicação desta regra em alguns casos. Daí decorre a necessidade da análise do contrato por um profissional especializado, uma vez que, dependendo do caso, mesmo existindo a dívida, se pode evitar a restrição do nome e assegurar manutenção da posse do imóvel.

Portanto, o consumidor que financiou o seu imóvel e hoje não consegue honrar com os pagamentos deve consultar um advogado ou advogada especializado(a), para que este(a) profissional possa analisar o contrato e verificar se existem abusividades que possam ser revisadas judicialmente. E o mesmo vale para aquelas pessoas que estão sofrendo a ação de execução extrajudicial e, ainda, aquelas cujos imóveis estão indo à leilão.

Dependendo do parecer recebido o valor do financiamento poderá ser recalculado e o leilão  cancelado.

INCLUSÃO INDEVIDA EM ÓRGÃOS DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO

Da indenização por danos morais por inclusão indevida

De acordo com nossos tribunais, quem sofre inclusão indevida nos órgãos de proteção ao crédito tem direito ao pagamento de indenização por danos morais. Falamos aqui, de dano moral in re ipsa, um dano que é presumido, decorrente da própria conduta ilícita, da própria situação vexatória,  humilhante sofrida pelo consumidor.

Os motivos mais comuns para inclusão indevida de consumidores são em casos de erros cadastrais, casos de homônimos (pessoas com nome idêntico a outra), fraude (clonagem de documentos), pagamento, prescrição de títulos.

Mas antes de incluir indevidamente qualquer consumidor, o órgão de proteção ao crédito possui o dever de notificar a anotação constante na sua base de dados, sob pena de violar o Código de Defesa do Consumidor.

Constatada a anotação negativa de forma indevida, o consumidor pode requerer a retirada dos órgãos de proteção ao crédito de forma administrativa ou ajuizar ação judicial, para querendo, pleitar o cancelamento da anotação cumulada com indenização por danos morais.

Normalmente são ações ajuizadas sob o rito dos Juizados Especiais Cíveis, mais conhecido como pequenas causas. O grande benefício deste rito é a celeridade processual, composta normalmente por duas audiências, a primeira de tentativa de acordo, a segunda de instrução e julgamento, nesta última também é renovada a proposta de conciliação. Muitos casos são solucionados através de acordo entre as partes, o que torna a finalização do processo ainda mais rápido.

Analisando alguns recentes julgados do Tribunal de Justiça Gaúcho, verifica-se que a jurisprudência varia muito quanto ao valor fixado a título de indenização. Os valores vão de R$ 2.000,00 (dois mil  reais) até R$ 8.000,00 (oito mil reais), variação que se deve ao rito escolhido, valor da ação e complexidade do caso. Assim, apenas para exemplificar transcrevo abaixo recente decisão de um caso real de fraude, do Tribunal de Justiça Gaúcho:

A instituição financeira, ao conceder crédito a clientes, deve se cercar de todas as cautelas necessárias, tais como a conferência dos dados fornecidos e das assinaturas apostas em documentos. Portanto, não tendo a ré se precavido ao conceder crédito mediante fraude, deve arcar com as consequências, não lhe sendo dado repassar tais ônus ao consumidor que foi vítima da fraude. Se da dívida gerada erroneamente decorre a inscrição em cadastros de inadimplentes, é corolário lógico a inidoneidade da inscrição. A inscrição indevida junto aos órgãos restritivos de crédito é motivo suficiente à configuração de lesão à personalidade, por se tratar de dano moral in re ipsa, que prescinde de qualquer demonstração específica. Quantum indenizatório fixado em R$ 8.000,00, considerando as características compensatória, pedagógica e punitiva da indenização, bem como estando em consonância com os casos análogos julgados por esta colenda Câmara. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70077725398, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Kraemer, Julgado em 26/06/2018)”

Na decisão o julgador destaca que a instituição financeira deve ter cautela no momento de conceder créditos aos seus clientes, não tendo atingido o cuidado necessário, deve arcar com as consequências de uma dívida gerada de forma indevida, fixando indenização por danos morais.

AUXÍLIO DOENÇA NEGADO

Todos os dias, milhares de segurados do INSS solicitam o amparo da instituição em momentos de necessidade, seja para concessão de aposentadorias das mais diversas ou de benefícios assistenciais, como o de auxílio-doença. Infelizmente, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) possui milhões de beneficiários e não conta com médicos especialistas em todas as patologias que acometem seus segurados, o que faz com que os procedimentos periciais realizados no âmbito administrativo sejam feitos por médicos do trabalho. Assim, é crescente o número de negativas quanto aos pedidos de auxílio doença formulados perante a autarquia.

Caso o seu benefício ou de algum familiar seja negado pela instituição, o segurado possui três opções:

  1. Aceitar a negativa;
  2. Ingressar com um recurso administrativo contra a decisão que negou a concessão do benefício;
  3. Procurar um advogado especialista em direito previdenciário e entrar com a ação judicial cabível.

A segunda opção mostra-se inviável devido à demora na análise do pedido e ao fato de que o mesmo médico do trabalho (não especialista na doença que acomete o segurado, portanto) será o responsável por analisar o recurso.

Em contrapartida, na ação judicial o segurado passará por uma perícia feita no âmbito do Poder Judiciário, realizada por um médico especialista na doença que acomete o autor do processo e de confiança do magistrado julgador da ação.

A ação de concessão de auxílio-doença é um processo judicial extremamente célere. No Rio Grande do Sul essas ações tramitam de forma eletrônica e perante a Justiça Federal.

O QUE É NECESSÁRIO PARA INGRESSAR COM A AÇÃO?

Caso você ou algum familiar seu tenha o pedido de auxílio-doença ou o prosseguimento na percepção do benefício negado pelo INSS, a autarquia deve fornecer uma carta de indeferimento de benefício. Normalmente o referido documento é enviado para a residência do segurado através dos correios, todavia, caso o documento não seja recebido, é direito do segurado obtê-lo perante a instituição na APS (agência de previdência social) com a qual o segurado possui vínculo.

Esse é o documento principal para o ajuizamento da ação, além de cópia do RG, laudos médicos recentes (se o beneficiário os tiver) e comprovante de residência atualizado.

COMO FUNCIONA A AÇÃO DE CONCESSÃO DE AUXÍLIO DOENÇA?

A ação de concessão de auxílio doença nada mais é do que a realização de uma nova perícia, conforme a realizada e negada pelo INSS, dessa vez perante um juiz federal e com um médico especialista (como um ortopedista e um cardiologista, por exemplo). O cliente será informado acerca da data, local e horário do procedimento por seu advogado, que o instruirá acerca de como proceder no dia. Após a juntada do laudo ao processo pelo perito, o procurador é intimado para se manifestar acerca do documento. A partir deste momento, o juiz decidirá pela procedência ou improcedência da ação, dependente do conteúdo do referido laudo. 

Eventuais valores atrasados serão pagos por meio de RPV (requisição de pequeno valor) e as parcelas vincendas (futuras) serão implantadas pelo INSS na folha de pagamento do segurado, mediante intimação nos autos do processo em trâmite.

Uma coisa é certa: dados recentes confirmam que a maioria absoluta dos segurados que ingressam com a ação de concessão de auxílio-doença logram êxito no processo e tem o seu direito ao benefício confirmado no âmbito judicial.*

* Hass Carazzai, Estelita. Benefício negado pelo INSS pode ser obtido na Justiça. Disponível em: < https://www.gazetadopovo.com.br/economia/beneficio-negado-pelo-inss-pode-ser-obtido-na-justica-b9b1d99scy295z8hy972vzsr2>. Acesso em:  09. Jul. 2018.